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terça-feira, maio 04, 2021

PESSOAS IMPORTAM

César Bernardo de Souza - ABRIL2021

O dia de hoje, 04 de maio, já está associado a acontecimentos que me impõem o pior dos sofrimentos – a morte de quem importa de fato.

Aqui em Macapá o coronavírus matou Promotor de Justiça Dr. Mauro Guilherme. Lá em Santa Catarina um jovem matou a facadas três crianças de até três anos, e duas professoras que colocaram suas vidas em defesa dessas e outras crianças também marcadas para morrer.  

As crianças importam em tudo, até para prolongar vidas de pessoas sós, idosas. Como foi o caso do papai, feliz o dia inteiro com a chegada, permanência e saída da criançada na Escola Tiburcinho. O barulho alegre e próprio da criança na escola bem ao lado da casa onde ele vivia sozinho há mais de trinta anos, era vida para ele.

As férias escolares davam-lhe um atestado, que ele mesmo traduzia sentimentalmente falando a terceiros: “Parece que a rua morreu sem aquelas crianças”. O valor das crianças para ele tinha essa dimensão.

Deus sabe quantas vezes o matariam se alguém entrasse naquela escola, coo em Santa Catarina e matasse a facadas algumas daquelas pequeninas. Deus sabe como ele morreria se uma das mães daquelas crianças tivesse que responder por morte do tipo a que se investiga ainda quanto ao pequeno Henry, de quatro anos morto ao longo de meses a pancadas – torturado.

O Promotor de Justiça Dr. Mauro Guilherme foi um homem que todos queríamos ser, ou todos deveríamos ser. As crianças mortas em Santa Catarina poderiam nos dar pessoas velhas e boas como o Dr. Mauro.

A vida sem as pessoas não é nada, às vezes uma rua, bairro até mesmo cidade sem elas é quase nada. Dias atrás sem quê nem porquê voltei aos meus 14 anos, quando ainda vivia na casa dos meus pais, ultima na esquina da rua onde nasci e vivi até os 18 anos.

Lembrei, contei, nominei e registrei em arquivo eletrônico trinta e quatro (34) meninas moças, jovens conterrâneas na nossa rua. Rua ainda sem pavimento, carroçável, volta e meia tratada a cascalho.

Nos dias de hoje, cinquenta e cinco anos passados, a rua é rigorosamente a mesma, mantida integra em seus metros, em seu perímetro, com todas as suas casas habitadas, à exceção a do papai, vazia desde sua morte aos 98 anos, em 2018, tem apenas uma moça, Roberta Queiroz. Rapazes também quase não há, se muito dois ou três.

É a rua sem vida, é a vida sem pessoas.  

   

sexta-feira, abril 09, 2021

CARTAS AO PORTADOR

César Bernardo – abril/21

Durante longos anos da minha vida escrevi cartas para amigos, especialmente para minha mãe. Era o meio de que dispunha para diminuir distancias e dividir a nova vida que decidi viver tão longe de casa, em Macapá, Território Federal. E claro que estava nisso um tanto de expectativa exagerada, solidão e medo do desconhecido, do fracasso e do muito que pesaria a desistência. 
Todo início de vida é difícil para qualquer pessoa, para mim tanto mais visto que, visto que o Amapá da década de 70 carecia de tudo, se socorria dos aviões de carreira para tudo, até para internar os tomates e pimentões do consumo geral. 
Foi uma época em que o dinheiro do salário não era suficiente para programar viagem de retorno em razão de férias e feriados, como muito depois veio de ocorrer anualmente. Logo eu já tinha uma família, esposa e filho, razão maior de minha permanência no Amapá. Só depois de seis anos pude tomar um avião de Macapá ao Rio de Janeiro e daí a Minas Gerais, à saudosa Volta Grande. Um grande alivio voltar para rever os meus, dizer-lhes e mostrar-me como me encontrava, quem sabe ouvir de algumas pessoas sobre as cartas que lhe havia enviado, até ali sem resposta. Quando fui de casa papai disse que me emprestava seu nome, portanto também era uma oportunidade de lhe prestar contas de como o estava usando. Também era um retorno de angustia ao não reencontrar certas pessoas tão especiais, porque se foram da cidade, casaram-se, enriqueceram ou morreram. Certo mesmo é que por muito tempo ainda continuei escrevendo cartas, recebendo algumas até que veio o fax. Já um pouco mais folgado com o dinheiro mensal comprei um aparelho para meu uso. Por causa da época e evolução por ele trazida o habito de escrever cartas foi diminuindo de necessidade. Bastante que alguém conhecido na cidade de destino tivesse receptor para que o fax substituísse as mal traçadas linhas. De minha parte aumentei bastante os artigos que escrevia para jornais (Ana Express - Do Dia – Diário do Amapá – Tabloide – Da Cidade – A Gazeta – O Liberal....) de sorte que fizesse as pessoas saberem como eu estava pelos escritos publicados, muitas vezes dando noticias minhas nas entrelinhas, com uso de palavras chaves aplicadas aos textos. Ao dizer, por exemplo, “tudo vai bem, cresce depressa...”, dizia o suficiente para meus familiares que por acaso lessem meus artigos nos jornais. Não lendo não podiam fazer cobranças porque a mensagem tinha sido publicada. Depois veio a internet, a telefonia móvel, o crescimento das redes sociais substituindo e sufocando a Orkut... escrever carta para quê? Mas em meio a essa evolução houve a remanescência da mãe e duas amigas, uma delas muito especial que ainda se comunicava comigo com cartas espaçadas entre si, porém, cartas espetaculares, bem escritas. Foram e estão guardadas, de vez em quando relidas., algumas das quais parecendo cartas de anteontem, atualíssimas. Veio então as modernas redes sociais e o telefone celular nas mãos de cada pessoa, às vezes dois ou mais. Aderi ao facebook, gostei e me afeiçoei à ferramenta tecnológica, através da qual “recuperei” velhos e bons amigos e amigas de àquele tempo. Postagens de cá e de lá e até mensagens expandidas via canal de recados, o Messenger me proporcionaram a satisfação de voltar a interagir com essas pessoas, acrescendo que até posso vê-las. Tudo uma enorme inovação na vida de todos nós, todavia não raro um voo de pombo correio supera a velocidade de internet disponível onde vivo.  

CARTAS AO PORTADOR

César Bernardo – abril/21

Durante longos anos da minha vida escrevi cartas para amigos, especialmente para minha mãe. Era o meio de que dispunha para diminuir distancias e dividir a nova vida que decidi viver tão longe de casa, em Macapá, Território Federal. E claro que estava nisso um tanto de expectativa exagerada, solidão e medo do desconhecido, do fracasso e do muito que pesaria a desistência.



Todo início de vida é difícil para qualquer pessoa, para mim tanto mais visto que, visto que o Amapá da década de 70 carecia de tudo, se socorria dos aviões de carreira para tudo, até para internar os tomates e pimentões do consumo geral. Foi uma época em que o dinheiro do salário não era suficiente para programar viagem de retorno em razão de férias e feriados, como muito depois veio de ocorrer anualmente. Logo eu já tinha uma família, esposa e filho, razão maior de minha permanência no Amapá. Só depois de seis anos pude tomar um avião de Macapá ao Rio de Janeiro e daí a Minas Gerais, à saudosa Volta Grande. Um grande alivio voltar para rever os meus, dizer-lhes e mostrar-me como me encontrava, quem sabe ouvir de algumas pessoas sobre as cartas que lhe havia enviado, até ali sem resposta. Quando fui de casa papai disse que me emprestava seu nome, portanto também era uma oportunidade de lhe prestar contas de como o estava usando. Também era um retorno de angustia ao não reencontrar certas pessoas tão especiais, porque se foram da cidade, casaram-se, enriqueceram ou morreram. Certo mesmo é que por muito tempo ainda continuei escrevendo cartas, recebendo algumas até que veio o fax. Já um pouco mais folgado com o dinheiro mensal comprei um aparelho para meu uso. Por causa da época e evolução por ele trazida o habito de escrever cartas foi diminuindo de necessidade. Bastante que alguém conhecido na cidade de destino tivesse receptor para que o fax substituísse as mal traçadas linhas. De minha parte aumentei bastante os artigos que escrevia para jornais (Ana Express - Do Dia – Diário do Amapá – Tabloide – Da Cidade – A Gazeta – O Liberal....) de sorte que fizesse as pessoas saberem como eu estava pelos escritos publicados, muitas vezes dando noticias minhas nas entrelinhas, com uso de palavras chaves aplicadas aos textos. Ao dizer, por exemplo, “tudo vai bem, cresce depressa...”, dizia o suficiente para meus familiares que por acaso lessem meus artigos nos jornais. Não lendo não podiam fazer cobranças porque a mensagem tinha sido publicada. Depois veio a internet, a telefonia móvel, o crescimento das redes sociais substituindo e sufocando a Orkut... escrever carta para quê? Mas em meio a essa evolução houve a remanescência da mãe e duas amigas, uma delas muito especial que ainda se comunicava comigo com cartas espaçadas entre si, porém, cartas espetaculares, bem escritas. Foram e estão guardadas, de vez em quando relidas., algumas das quais parecendo cartas de anteontem, atualíssimas. Veio então as modernas redes sociais e o telefone celular nas mãos de cada pessoa, às vezes dois ou mais. Aderi ao facebook, gostei e me afeiçoei à ferramenta tecnológica, através da qual “recuperei” velhos e bons amigos e amigas de àquele tempo. Postagens de cá e de lá e até mensagens expandidas via canal de recados, o Messenger me proporcionaram a satisfação de voltar a interagir com essas pessoas, acrescendo que até posso vê-las. Tudo uma enorme inovação na vida de todos nós, todavia não raro um voo de pombo correio supera a velocidade de internet disponível onde vivo.