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quinta-feira, junho 04, 2020

ESTRELA HANNE

César Bernardo - 07 maio-2008
Certa vez, Deus estando a passear pelo firmamento para ver bem de perto como iam as suas criaturas, ouviu risos muito francos aqui mesmo em Macapá, ali nas imediações do barzinho-restaurante do Trapiche Eliezer Levi. Satisfeito com o estado de satisfação da moça que ria, aproximou-se, chamou-a de minha filha e perguntou por que ria tão francamente.
Hanne respondeu-lhe que ria porque acabava de entender o sentido de sua existência: era uma estrela.
Ainda rindo disse a Deus que lhe agradecia tê-la feito estrela e mandado o sol brilhar antes de si, além de pendurá-la fixamente no firmamento diferentemente daquelas estrelas cadentes especialmente importantes para amantes, poetas e principalmente os sonhadores.
Tem sido bom – disse Hanne a Deus – que eu apenas brilhe sem parar.
Deus, celestialmente compreensivo com o estado de espírito daquela sua criatura resolveu aumentar a intensidade da sua luz, mandando que ouvisse o que uma criança dizia à sua mãe naquele momento em, algum ponto da terra:
“Mamãe já vai surgir um novo dia, aquela estrela lá adiante vem sempre antes do sol trazendo o anúncio do suceder dos dias. Que linda!, Quantos pessoas esperam por ela todos os dias!. Todos que a vêem recebem de Deus a graça de viver mais um dia de sonhos, de desejos, de feliz aventura na terra”.
Da forma que apareceu, Deus desapareceu de diante da Hanne,  que por sua vez passou a compreender bem melhor o sentido de sua existência, decidindo doar-se mais ainda ao cumprimento da missão de desarmar o espírito das  pessoas em favor, apenas, da simples tarefa de viver.
Pois bem, Hanne Capiberibe morreu. Quarta feira passada, estando eu nas galerias da Assembleia Legislativa, onde se realizava seu velório, vi seus colegas jornalistas trajando camisas brancas tendo ao peito sua foto bem jovial e no rodapé a frase: te amamos.
Bem depois, no momento das homilias, frei Apolônio interpretou o filme da vida da “estrela” Hanne, dizendo diretamente aos seus pais Orlando e Raquel:
“Acabamos de vê-la bem pequena, criança, jovem, adulta e, morta. Eis a realidade da vida: nos diminuímos para voltar ao ventre de onde viemos.”
Tantas pessoas pediram a Deus pelo restabelecimento de Hanne, milhares de pessoas velaram o seu corpo e o conduziram a ultima morada., sinal inequívoco de que ela foi uma pessoa importante, especialmente para os seus familiares e amigos.
Sendo assim, fiquemos a vê-la como a “estrela Hanne” brilhando todos os dias no céu do Amapá, depois e antes do sol.

segunda-feira, junho 01, 2020

QUE DEUS POSSA . . . .

César Bernardo - junho/2020

 A já prolongada temporada de isolamento social no Brasil já descambou para a gozação nas redes sociais mais comuns, aqui e ali. Fases e mais frases espirituosas, algumas muito bem construídas a ponto de divertir e dar o que pensar. 
Ontem mesmo me apareceu uma muito bem humorada: “se me perguntarem o que a pandemia me ensinou respondo na lata – lavar louça e arrumar casa”. Conheço bem o amigo que a postou ou replicou de postagem original, também conheci sua mãe e o enorme orgulho de nos apresentar o filho como um grande advogado. Sei que arrumar casa e lavar louça nunca foram itens de sua banca.
É grande a quantidade de tiradas como essa, tanto quanto a lista centenária de mortos aqui no Amapá por a tal Covid19. No dia de hoje já são duzentas e vinte e duas essas vítimas do coronavirus, pessoas nossas, muitas delas perdendo a vida sem a devida chance de preserva-la. 
Na casa das dezenas estão lembranças de pessoas assim vitimadas antes de boa convivência comigo, já nas centenas estão todas essas vidas terminadas a peso de frases curtíssimas, useiras e vezeiras piedosas manifestações de pesar: Deus a(o) tenha – Que Deus possa... – Meus pêsames - - -
Assim, simples assim, desaparecemos. Aliás, assim para os especiais porque para os comuns não se chega nem a isso. Um dia qualquer perguntamos por fulano e alguém responde: “vi falar que morreu, mas não tenho certeza”. 
Estamos perdendo muita gente por causa de Covid19, mas somadas a elas estão os mortos de sempre: outras doenças, facada, tiro, atropelamento, queda de moto, suicídio, afogamentos. De uns dias para cá os que permanecemos vivos morremos por dentro ao ver nossa gente tão importante desaparecendo em dias, veladas em horas, enterradas sós e em minutos. Muitas dessas pessoas viveram ilustremente e receberiam honras fúnebres, mas são desaparecidas rapidamente para que sobreviventes não se contaminem de si.
      Estamos na época das grandes chuvas amazônicas, chove demais e nada mais doloroso do que escutar o som do caixão com a água na cova onde deixamos esses nossos entes queridos. É uma dor que sangra e faz em nada os nossos corações. Cansa tantas noticias de morte sobre alguém que voce está impedido de ver estendido na pedra mortuária. Apenas hoje mais sete dos nossos passamos ao livro do Deus a(o) tenha – Que Deus possa... – Meus pêsames - - -
Diz hoje o mesmo advogado agora craque em lavar louça e arrumar casa: “A vida tem me afastado de tanta gente, que quando pergunto quem vai restar uma voz, lá no fundo, responde: Quem for essencial”.