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terça-feira, março 22, 2016

ZABELA É DE MORTE.

c-bernardo2012@bol.com.br
Zabela era engraçadinha, um doce de moça, mas obsessiva por animais. Dizem que tinha catorze gatos, um cachorro para cada portão, cada janela do carro, e conforme a cor, tecido do vestido e a festa para a qual fora confeccionado também tinha que ter um cachorro apropriado.
Qualquer bicho era sagrado para Zabela, não podia ser sacrificado nem para remédio, tinha que ser protegido a qualquer custo. Não é preciso que diga que era vegetariana, necessário no entanto frisar: radical. Viesse a saber que a alface da salada fora adubada com esterco animal, também não comia. Nesse particular a Zabelinha era um entojo.
Mesmo assim, todo mundo gostava de Zabela, uma gracinha, inteligente como ela só, e que par de coxa. Era bióloga, especialista em crustáceo, sua paixão era o caranguejo.
Certa vez deu um escândalo no boteco do Jóia, quando ainda era lá no Beco dos Velhacos, no auge, todos os dias lotado, só porque não se sabe como o tira-gosto do dia foi patinha de caranguejo.     
Zabela rodou a baiana, primeiro quis saber como diabos foi parar nos cafundós de Minas Gerais, no minúsculo boteco do Jóia, ali no Beco dos Velhacos, as tais patinhas de caranguejo, mais de uma para cada frequentador naquele dia. Coisa do Chico Bóia, disseram a ela com certa paciência – trouxe do Rio de Janeiro. Seu presente de aniversário aos amigos da esbornia.
Vencida Zabela fez um discurso sobre a necessidade de proteger aqueles animais, mantê-los nos manguezais...berçário disso e daquilo, etc. Não fez nem menção de pagar a cervejinha que já tinha bebido, também não o traçado de vermute que costumava tomar como “entradeira”.
Foi-se Zabela batendo as tamancas no chão com muita força, puxando os cabelos amarelos para o alto da cabeça, prendendo-os como um tufo com grampos que levava nos cantos da boca como tridentes. Assim com tanta raiva Zabela era a expressão da beleza, os seios pareciam pulsar para explodir, os olhos enchiam tudo de azul, a saia subia até onde queria, a roupa marcava bem os contornos do seu corpo, e que par de coxa.
Não demorou correu a noticia de que Zabela tinha sido aceita para o mestrado na Itália, o Jóia pôs o boteco a disposição para as despedidas, tira-gosto só jiló ao molho, batatas miúdas ao azeite, rodelas de cebola crocante, caldo verde a vontade - Zabela topou. 
Neneco compareceu, deixou para trás a dengue que o prostrava, não podia beber, mas gostava muito da sobrinha Zabela. 
A certa altura a bela avisou: vou criar aqui e filiar na Itália uma Ong de proteção integral a todos os animais. Exclamação geral:
-Zabela é de morte.
-Tá naquela idade difícil, virando dos vinte para os trinta.
-Que iniciativa, que gênio...
Até que veio a observação do Neneco: E os mosquitos?
Pronto, foi o bastante para Zabela abandonar novamente o boteco do Jóia, do mesmo jeito que antes o fizera. Até os comentários foram os mesmos...que par de coxa!
Zabela passou anos na Itália e depois mudou-se para um lugar qualquer da África. O Jóia morreu, assim de repente...uma consternação geral – um dos poucos sujeitos melhor vivo que morto.
O boteco, patrimônio da cidade, foi para as mãos do Jorge Tomate – ficou Boteco do Tomate; lá mesmo surgiu o boato de que a culpa do Zica é da Zabela que teimou mundo a dentro em proteger mosquitos.   


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